27 de julho de 2012

Citius, Altius, Fortius / Ágora/Novo Jornal 236/ Luanda 27/7/2012





Quando a chama olímpica se acender neste fim de Julho de 2012, Londres prepara-se para ser a primeira cidade a receber pela terceira vez os Jogos Olímpicos da era moderna. A primeira em 1908 e a segunda quarenta anos depois, 1948, na ressaca da segunda guerra mundial.
Numa Europa marcada pela recessão, estes jogos mercantilizados, numa escala inimaginável pelos seus criadores, serão talvez marcados pelo facto de o Reino Unido passar uma imagem de modernidade e romper com o classicismo vitoriano surgido no século XIX e que perpassou todo o século XX.
O nosso País vai estar presente, pela sétima vez, com os seus atletas, e antevejo que nos iremos quedar pelas primeiras eliminatórias nas modalidades individuais; uma presença simpática no basquetebol feminino; e uma esperança numa honrosa participação da equipa feminina de andebol.
Não vale a pena chorar sobre o leite derramado pela inabitual ausência do selecionado masculino de basquetebol, mas é seguramente importante que comece uma discussão alargada sobre o futuro da educação física e desporto angolanos, num quadro de desenvolvimento interno, de participação vitoriosa dos nossos atletas a nível continental e, inerentemente, uma digna representação em torneios internacionais.
Todos sabem que há Jogos Olímpicos de quatro em quatro anos desde 1896, exceto o período entre Estocolmo 1912 e Antuérpia 1920 e entre Berlim 1936 e Londres em 1948, hiatos motivados pelas duas guerras mundiais. O COA e as entidades reitoras do desporto angolano devem planear atempadamente a participação nos jogos e programar nesse quadriénio a preparação dos atletas que irão representar o País. Exijam-se às federações planos exequíveis para uma participação condigna, mas simultaneamente dotem-nas de recursos humanos e financeiros para que os resultados previsíveis apareçam, e nada possa falhar, e onde as habituais desculpas da inépcia recorrente não sejam sempre fundamentadas na falta de cumprimento de promessas.
Os dirigentes terão que passar a ser confrontados com resultados e não alijarem responsabilidades para os elos mais vulneráveis: técnicos e praticantes.
Não podemos olhar para os Jogos Olímpicos como em tempos encarávamos as nossas participações nas “Espartaquíadas” em que “íamos lá fazer uma perninha”. Também não estou a dizer que vamos fazer medalhados, o que alvitro é que deve haver um planeamento cuidado e com objetivos rigorosos de lutar pelo melhor possível e ir o mais longe que se puder, mas com profissionalismo e denodo.
Em tempos idos, as nossas seleções obrigavam-nos a estar acordados, e nunca olvidarei a vitória de Angola à Espanha nos J.O. de Barcelona (83-63) em basquetebol, num tempo em que as vitórias tinham outras conotações que extrapolavam o campo meramente desportivo.
A primeira participação de Angola em Jogos Olímpicos foi em Moscovo 1980. Em 1976 foi convidada a estar presente em Montreal, mas declinou o convite por solidariedade com os países africanos que impuseram ao COI um boicote pela presença da Nova Zelândia, que tinha furado o boicote ao apartheid sul-africano ao participar num torneio de rugby. Os jogos realizaram-se sem a presença de atletas africanos.
A discreta participação em Moscovo da delegação angolana tem uma história curiosa das muitas que vamos colecionando nestes 37 anos de País que levamos. Havia um hábito normal, nos países do socialismo científico, de enviarem, com as delegações desportivas nas viagens ao estrangeiro, alguns elementos da segurança de estado. Dizia-se que seria para evitar aliciamentos, deserções, para que não fossem tentados a participar em ações contrarevolucionárias, etc.. Os responsáveis da então “Segurança de Estado” da então R. P. Angola começaram a enviar esses agentes, um mau hábito que felizmente durou pouco.
Na delegação a Moscovo lá foram, e normalmente tentavam ser tão discretos que não raras vezes acabavam por ser os únicos a dar nas vistas, o que incomodava toda a gente. A determinada altura, no avião, uns atletas malandrecos começaram a perguntar-lhes “que modalidades iam disputar”, se “tinham roupão para a natação” e outras brincadeiras do género. Na aldeia olímpica, e como eles dormiam junto dos atletas, abundavam os dichotes do tipo “Quando é que vocês entram em competição?” “Treinavam quem?”, etc. Quando regressavam a Luanda, os atletas contavam estas histórias que motivavam um riso pegado e talvez tenha sido mais um bom argumento para deixarem de ir como penduras.
“Declaro abertos os Jogos Olímpicos de Londres 2012”.
Fernando Pereira 24/7/2012

20 de julho de 2012

Mudar para que tudo fique na mesma? / O Interior / 20-7-2012





No Brasil costuma-se dizer que rico de cidade é imediatamente “doutor” e proprietário agrícola é logo “coronel”. Não tem nada de especial, pois temos recebido do Brasil futebolistas, telenovelas, empregados de hotelaria, professores, dentistas e outras profissões multifacetadas, portanto também temos pleno direito de reproduzir os seus status. Eça dizia que «o brasileiro tem os defeitos dos portugueses só que dilatados pelo calor».

Uma prévia declaração de interesses: “dessou” licenciado.

Volta e meia lá vem este folhetim das licenciaturas. Agora é o ministro Relvas, que nada tem a ver com o distinto republicano José Relvas (1858-1929), este sim, um impoluto político ribatejano, que anuncia a 5 de Outubro de 1910 a instauração da República do alto da varanda da Câmara Municipal de Lisboa.

Não gosto particularmente deste Relvas, pelos mesmos motivos políticos porque não gosto dos que lá estiveram antes. Ando preocupado com a “histeria nacional” em volta da licenciatura do ministro, mas apenas porque considero isto uma cortina de fumo para que não se discutam os verdadeiros problemas com que os portugueses se confrontam, e esses sim, deviam ser mobilizadores para uma maior participação na rejeição. O Relvas fez o mesmo que a maioria dos que andam por lá calados fizeram, que foi pedir um diploma para colocar numa moldura por cima de um cão de porcelana, no hall de entrada da casa.

Há dezenas de anos que sei de diplomas deste tipo em universidades públicas e privadas e institutos, a maior parte deles privados de um mínimo de dignidade para darem os velhos cursos do “Álvaro Torrão”, quanto mais cursos de “Epistemologia das Ciências Sociais” ou “ Técnico de turismo final”, como agora chamam aos cangalheiros com licenciatura.

Sou do tempo das passagens administrativas que muito profissional prestigiado na nossa praça usufruiu; Sou do tempo dos exames para militares, em que podiam quase ter um exame de dois em dois meses; Sou do tempo em que o IARN aprovou licenciaturas feitas “além-mar” em locais onde nem uma escola de artes e ofícios havia; sou do tempo em que o instrutor de educação física, mestre de artes, professor de lavores, professores primários e por aí adiante passou tudo a licenciados com um golpe de magia, tipo Conde de Aguilar, e ninguém ligou ou fez que se ligasse.

Podia estar aqui a desfolhar milhares de situações deste tipo, mas acho que a opinião mais feliz sobre o assunto veio do Jerónimo de Sousa: «…antigamente chamavam-se os doutores da mula ruça»!

Por absurdo, ninguém pensou que pode estar o Miguel Relvas a rir-se porque o governo vai saindo com legislação em catadupa, privatizações em riste e outras manobras ultrajantes, enquanto se discute o diploma de licenciatura, sem tampouco se saber quem é do GOL alto ou da Soberana da Malta, esses sim, os verdadeiros mandantes do país.

Neste amadorismo circense ainda há tempo para aparecer o senilocrata Soares a dizer sobre o Euro: «Se não há dinheiro emitam-se notas», algo do tipo Maria Antonieta quando lhe disseram que «O povo não tem pão» e ela retorquiu «Se não tem pão coma brioches». Pelo menos esta ficou sem cabeça para não reproduzir mais dislates.

«No es necessário decir todo lo que se pensa, lo que si es necessário es sentir e pensar todo lo que se dice», Quino.



Texto escrito recorrendo a uma ortografia que não sei se é a antiga se é a posterior ao acordo.



Por: Fernando Pereira





O Interior - Diário da Guarda - 19-07-2012 - Opinião - Mudar para que tudo fique na mesma?

O Interior - Diário da Guarda - 19-07-2012 - Opinião - Mudar para que tudo fique na mesma?

Revisitar é preciso! / Novo Jornal 235/ Ágora/ Luanda 20-7-2012




A derrota da seleção angolana de basquetebol, frente à congénere russa, no recente play-off de apuramento para os Jogos Olímpicos de Londres, deixou no quotidiano desportivo nacional um sentimento enorme de desilusão e frustração.
Há alguns tempos a esta parte que vamos assistindo a sucessivos insucessos no quadro competitivo das seleções nacionais, e nem as recentes vitórias dos selecionados femininos de andebol e basquetebol conseguem esconder o estado pré-comatoso do desporto nacional.
Se olharmos em redor, vemos que o futebol angolano não consegue ultrapassar a mediania no continente, quer a nível de clubes quer ao nível das diferentes seleções. O basquetebol, apesar do mérito indiscutível da conquista do campeonato africano por parte da seleção feminina, vê o seu selecionado masculino a soçobrar porque a renovação não foi feita no tempo devido. No andebol feminino vamos mantendo a hegemonia, mas no andebol masculino vamos sendo cada vez piores. As outras modalidades coletivas começam a estar apenas a um patamar acima do desporto de recreação, o que as torna irrelevantes no quadro competitivo. Nas modalidades individuais o marasmo é demasiado evidente. O estado geral do desporto angolano, depois de um período de mobilização de vontades, de dinamismo organizativo, de participação massiva, com políticas desportivas objetivas conseguiu guindar o desporto angolano para a primazia ao nível continental e para o galarim das grandes competições internacionais.
Não vale a pena procurar culpados pela situação atual, porque a realidade tem a ver com a ausência de políticas económicas e sociais perenes no País e consequentemente a desarticulação das políticas sectoriais, onde a cultura física e o desporto é uma vertente com alguma importância na promoção e formação da juventude angolana.
Enquanto se vai deixando abastardar a política desportiva, que teve os seus cabocos no início da década de oitenta do século passado, vamos assistindo a um cada vez maior divórcio entre a juventude e a prática desportiva regular, por vários motivos onde avulta a falta de organização das estruturas e a desmotivação que se vai instalando, mercê do aparecimento de novas conceções impactantes na chamada “sociedade de mercado”.
As federações desportivas foram-se transformando em lugares de discussão estéril e de afirmação para alternativas que a maior parte das vezes pouco têm a ver com o desporto. Durante as eleições discutem-se pessoas e não se consegue vislumbrar programas de trabalho onde se promova a área formativa de técnicos e dirigentes, mobilização de recursos tendentes a possibilitar uma adesão massiva de crianças, adolescentes e jovens, desenvolver o quadro competitivo nos diferentes escalões e alargá-lo a todo o País, e no fim assumir a seleção nacional como reflexo de todo um trabalho continuado e largamente participado.
A manter-se esta situação, vamos ver regredir, mais rápido do que aparentemente se julga, o desporto angolano para algo do tipo “quintal” que era mais ou menos aquilo a que se assistiu no estertor do tempo colonial.
É absolutamente indispensável um grande debate sobre a cultura física e o desporto, com caracter de urgência, e que daí saiam, para a nova Assembleia Nacional, propostas de legislação que permitam mobilizar a juventude, aliciá-la para uma atividade física regular e incutir-lhe valores de solidariedade, lealdade e respeito tão queridos na sã competitividade.
Obrigar o Estado a dar verbas suficientes para a formação e motivar as empresas para contribuírem para a sustentabilidade da atividade competitiva nacional e nas competições internacionais, são apenas algumas das muitas propostas que têm que ter enquadramento legal e cumprimento obrigatório de forma a não deixarmos sectores tão importantes ao sabor dos balanços do “mercado”, da volatilidade da “mercadoria” e claro dos “sabores e dissabores” de alguma gente.
A cultura física e o desporto têm que voltar a ter a mesma importância que a saúde, a educação e a cultura, num quadro de uma sociedade que se pretende mais harmoniosa e menos ostensiva e pedante ao nível da afirmação de valores.
Quando se mudarem dirigentes desportivos, tem que se ter em consideração que o mais importante mesmo é mudar-se de política. Era muito bom que cada vez mais tivéssemos aberto melhorados caminhos à política desportiva encetada por Ruy Mingas e a sua equipa há mais de trinta anos, mas a realidade demonstra à saciedade que a regressão nalguns casos é demasiado evidente, o que não deixa de ser preocupante.
Fernando Pereira
16/7/2012


13 de julho de 2012

O PASSADO PRESENTE / Ágora / Novo Jornal 234/ Luanda 13-7-2012






Só agora li o livro de Mário Moutinho de Pádua “No Percurso de Guerras Coloniais 1961-1969”, das edições Avante, e o que se me oferece dizer é que estamos perante um trabalho interessante, politicamente comprometido e revelador de que a distância entre as convicções do idealismo e a realidade vivida no quotidiano é, em muitos casos, diametralmente diferente.
O médico Mário Moutinho de Pádua, filho de um conhecido e respeitado advogado e notário na Luanda dos anos enta (50-60), foi o primeiro-oficial português a desertar na guerra colonial em Outubro de 1961 e a juntar-se aos movimentos de libertação. Ao tempo foi uma pedrada no charco na sociedade luandense, já que, para além da histeria dos colonos ainda muito presente em função do 4 de Fevereiro e do 15 de Março de 1961, o alferes Mário Pádua era branco e abastado.
O livro é um depoimento importante que acrescenta novos detalhes de um período da guerra de libertação, onde as situações não foram, nem de perto nem de longe, o idílio que muitas vezes nos querem transmitir, numa história algo ficcionada do que foi a guerrilha e os seus contornos, lutas de poder internas em que as traições eram urdidas com base no tribalismo e no racismo, a sordidez das relações pessoais de permanente desconfiança, na realidade tudo ao contrário do que os manuais defendiam, e que a propaganda fazia ecoar para o exterior dos movimentos.
Ao longo do livro, Mário Pádua não deixa transparecer nenhum azedume, apesar da forma violenta e aviltante como foi tratado tentando, tanto quanto possível, encontrar justificações para tudo nos diferentes colonialismos, ou melhor, no mesmo colonialismo de feições diferenciadas.
Um dos lugares onde Mário Pádua esteve a trabalhar foi na Argélia, a partir de 1963.
A Argélia ascendeu à independência em 5 de Julho de 1962, há 50 anos precisamente, depois de uma longa luta contra a potência colonial, a França, e as organizações paramilitares dos colonos que se mobilizaram na OAS, estrutura terrorista de direita que endureceu a guerra de libertação. Sobre este momento e a vontade dos argelinos de se juntarem à FLN, no filme “A batalha de Argel “[The Battle of Algiers] (1966) estão superiormente documentadas algumas fases dessa luta, neste que foi o primeiro filme argelino feito depois da independência.
A França teve que acolher cerca de dois milhões de “pied noir”, termo pejorativo pelo qual eram tratados os franceses na Argélia, Tunísia e Marrocos, situação parecida com os portugueses brancos nascidos nas colónias onde eram conhecidos como “portugueses de 2ª”.
A Argélia logo se transformou num local de acolhimento para nacionalistas africanos e refugiados políticos de várias ditaduras da Europa e da América latina, um verdadeiro farol de liberdade num mundo totalitário. O “Senhor Ben Bella” como depreciativamente a Emissora Nacional portuguesa e a sua dependente Emissora Oficial de Angola tratavam o 1º presidente da Argélia, em 1964 passou a apoiar o GRAE em detrimento do MPLA e isso levou a que a UPA alterasse a sua sigla para FNLA, inspirada na FNL. Felizmente que Houari Boumédiène voltou novamente a apoiar o MPLA, e a Argélia esteve sempre na vanguarda da defesa da luta contra o sistema colonial português em África, como também esteve sempre na primeira fila na luta pela restauração da liberdade em Portugal.
No dealbar dos anos setenta vim estudar para Coimbra, ainda para o Liceu, e num dos primeiros dias de aula, o diretor de ciclo chamou-me ao gabinete e fez-me inúmeras perguntas sobre Angola, que já teria visitado integrado numa visita de orfeonistas ou tunas da cidade. Ao fim de uns minutos, oferece-me o livro de Jacques Soustelle, “Carta aberta às vítimas da descolonização”. Pede-me para ler referindo que mais tarde “trocaríamos algumas ideias sobre o assunto”. O autor era um membro das OAS e só conseguiu parir uma porno-chachada literária hecatombótica sobre a Argélia, De Gaulle e a “necessidade de combater o comunismo que irrompia por todo o lado”. Nunca percebi porque é que o Dr. José Bandeira me deu aquilo, porque na realidade fomos poucos os escolhidos para o receber. A verdade é que, em determinada altura, quis que me inscrevesse numa estrutura que se chamava “Centro de Estudos Ultramarinos” e sinceramente não me inscrevi por razões que ao tempo nada tinham de políticas, mas vontade de fazer outras coisas que me eram mais motivadoras. Ainda hoje tenho o livro na estante, acompanhado na prateleira de múltiplos livros que “os retornados” escreveram e inundaram o panorama livreiro português durante décadas.
Como dizia Proust em “La Recherche du temp perdu”: “ La véritable voyage de découverte ne consiste pas à chercher de nouveaux paysages, mais à avoir de nouveaux yeux”.
Fernando Pereira
11/7/2012

6 de julho de 2012

ANALOGIA SILENCIOSA./ Ágora / Novo Jornal 233/ Luanda 6-7-2012





Os órgãos de informação, que noutros tempos foram de “difusão massiva”, trouxeram para a ribalta as mais recentes descobertas em torno do santuário megalítico de Stonehenge, situado nas planícies de Salisbury, no Sul de Inglaterra.
Depois de muitas opiniões e estudos, na comemoração recente do solstício de Verão, surgiu a convicção de que as pedras deste extraordinário espaço arqueológico terão sido trazidas de vários pontos da meridional Inglaterra e do País de Gales. A teoria fundamenta a tese de que vários povos desta alargada zona teriam transportado as pedras dos seus locais para as oferecer aos deuses e daí a sua diversidade em consistência, dureza e multiplicidade cromática.
Stonehenge é um local fascinante e que provavelmente pouco terá a ver com Luanda, mas lembrei-me, nem sei a que propósito, de que no antigo Largo do Baleizão, em redor de um monumento edificado pela cooperação cubana para simbolizar a unidade do País, se colocaram dezoito grandes pedras a simbolizar cada uma das províncias de Angola. As pedras foram escolhidas com algum critério em cada uma das províncias e colocadas em redor de um monumento que substituiu o que estava erigido ao Infante D. Henrique. Um acrescido valor simbólico ao largo.
Sem surpresa, e mais uma vez com o arrojo estulto do desconhecimento, veio a ordem peregrina para as pintar de cor de laranja. A partir daí deixaram de simbolizar o que quer que fosse. Com o arranjo da “4 de Fevereiro”, as pedras foram tiradas e o largo encontra-se em intervenção dentro do plano geral de requalificação da “Marginal”.
As antigas instalações industriais da Congeral estão a ser objeto de uma intervenção notável para a instalação do futuro Museu das Forças Armadas, o que não deixa de ser um trabalho de reconhecido mérito. Das minhas alegres visitas regulares de criança ao “Baleizão”, ainda me permanece na memória o intenso cheiro a sabão que impregnava o largo.
Outra novidade recente tem a ver com a notícia da separação de Tom Cruise e de Katie Holmes. As razões da separação terão a ver com o fanatismo do ator pela “Cientologia” , religião a que aderiu na década de 80, tendo sido mais tarde considerado pelos líderes da seita o "Cristo" da cientologia. Fundada nos Estados Unidos, em 1954, pelo escritor de ficção científica Ron Hubbard, a filosofia prega a imortalidade do ser humano e estimula a limpeza da alma e da mente. Para os adeptos, o homem é um ser imortal, composto de três partes: corpo, mente e espírito. Sua experiência vai muito além de uma só vida, acreditando na reencarnação. A salvação depende de si mesmo, de seus semelhantes e da sua relação com o universo.
Ressalvando que não tenho a mínima inclinação para qualquer tipo de igreja ou crendice, aconteceu-me uma história interessante numa visita a Londres, no templo da tal “Igreja da Cientologia”.
Acompanhado de um amigo deslocava-me ao longo da Queen Victoria Street para atravessar a Ponte do Milénio em direção à magnífica Tate Modern. Começa uma chuvada que nos obriga a recolher num umbral de uma porta, curiosamente a sede da “Cientologia” em Londres. O meu amigo, entusiasmado porque sabia que Travolta, Chick Korea, Bono, e outros professavam este culto, arriscou sugerir entrarmos e ver o que “afinal era isto”.
Entrámos nas instalações sumptuárias de uma casa vitoriana requintadamente decorada e fomos a uma receção onde manifestámos interesse em conhecer “algo sobre a Cientologia”. A rapariga inquiriu-nos das razões de estarmos ali, de onde éramos, em suma, o habitual. Fomos seguidamente para um extraordinário escritório todo forrado com madeiras exóticas onde uma senhora, que presumi ter alguma diferenciação na hierarquia, nos começou a explicar o “bê-á-bá” do credo. Manifestou-se particularmente agradada por eu ser angolano, e anteviu uma hipótese de participar na instalação de alguma eventual “sucursal” em Angola. Preparava-se para me dar uma quantidade de livros e documentos, mas o meu agnosticismo e o excesso de peso do material, fizeram-me recusar, tendo levado apenas um livro em brasileiro do tal Ron Hubbard, que li até meio, e que me pareceu mesmo ficção científica.
Durante cerca de um ano fui recebendo telefonemas, documentos, mails e tentativas de abordagem diversa no sentido de me entusiasmarem como “missionário da Cientologia” em Angola, mas como ainda vou tendo alguns pruridos em relação ao absurdo, fui declinando cada vez menos educadamente a proposta.
Em determinada altura perguntaram-me se havia alguém que pudesse estar sensível a esta tarefa. Lembrei-me de tanta gente a quem não me importaria de embaraçar!... Mas a partida ficou em carteira para pregar a alguém, um dia destes!
Fernando Pereira
5/6/2012


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