29 de janeiro de 2011

“Os Comediantes” Ágora/ Novo Jornal/ Luanda /29-1-2011




O regresso recente de “Baby Doc” ao Haiti, fez-me recordar “Os Comediantes”, um dos livros de um percurso literário de um dos mais multifacetados jornalistas do século XX, Graham Greene (1904-1991).
O pano de fundo dos “Comediantes” é o Haiti do sanguinário “Papa Doc”, alcunha de François Duvalier, que governou em ditadura o País entre 1957 e 1971.
Já Jean Bernard Aristide, padre, antigo opositor à ditadura dos Duvalier, que sofreu as agruras dos torcionários do regime haitiano, os “tontons macoutes”, e que depois de ocupar a presidência decidiu esquecer toda a sua verborreia revolucionária e as suas convicções católicas para robustecer as suas contas bancárias, escapando da ira da população para um exílio dourado. Parece que o Haiti vai continuar a ter que viver com esta tralha toda, que reaparecem com enorme espírito de missão pois já que sabem que há hipóteses de uns trocos avultados para a reconstrução de um País, que tudo de mal lhe acontece, e nem o vudu consegue dar a tranquilidade aos seus habitantes que vegetam e que lideram as piores classificações do mundo no que aos números do desenvolvimento, cuidados primários de saude e qualidade de vida dizem respeito.
Porque a história de Brown, dono de um hotel em Port-au-Prince, o Trianon, onde se cruzam a senhora Pinheda, o casal vegetariano Smith e Jones o golpista inglês, é a trama deste “Comediantes”que se desenvolve nas mais bizarras situações. Um Haiti sombrio, mas com muitos óculos escuros dá-nos um enredo parecido aos que pontualmente tenha assistindo noutros lugares, particularmente no nosso País.
Saiu recentemente em Portugal o livro “Eu roubei o Santa Maria” do luso galego Jorge Soutomaior, nome de guerra do activista José Fernandez Vasquez, comandante do DRIL pelo lado espanhol, que em determinada altura dos acontecimentos entrou em rota de colisão com Henrique Galvão (1895-1970).
Henrique Galvão no livro “ O Assalto ao Santa Maria”, da colecção Compasso do Tempo, editado pela Delfos em 1973, omite algumas das muitas revelações do livro de Soutomaior, provavelmente por razões que se prendiam com a tentativa de liderança formal de uma chefia bicéfala que constituía o DRIL (Directório Revolucionário Ibérico de Libertação), e seguramente pelas características militaristas e profundamente radicais de direita do major Galvão.
Uma das revelações do livro de Soutomaior é assumidamente a opção Angola, e Fernando Pó (hoje Guiné Equatorial, então colónia espanhola), o que não cola exactamente com o que diz Galvão que falava de Fernando Pó e S. Tomé e Príncipe, onde se iriam arranjar reforços para um assalto em Luanda, que já estaria a ser preparado, e que era nem mais nem menos que o 4 de Fevereiro de 1961.
Visto a esta distância, consultados os livros, a imprensa da época, a emoção dos discursos do Salazar, os depoimentos de alguns intervenientes e passageiros do paquete não deixamos de pensar nalgum quixotismo da operação apesar dos incipientes meios de defesa das colónias portuguesas e espanholas em África nesse longínquo dealbar dos anos 60.
O que de certa forma me deixa perplexo é haver pessoas, curiosamente não intervenientes no 4 de Fevereiro de 1961, há cinquenta anos que questionam em Angola a relação entre este mediático acontecimento e o surgimento do que se convencionou historicamente chamar o início da luta armada no País.
Houve necessidade de explorar mediaticamente a “operação Dulcineia” a favor de uma qualquer movimentação que estava em marcha em Luanda, de forma a libertar os presos políticos angolanos que se encontravam em S. Paulo, no Penedo ou na unidade móvel nº7, e isso é um dado incontornável.
Luanda estava pejada de jornalistas, alguns ainda saídos da refrega no Congo, e não havia melhor publicidade que um levantamento pela libertação de presos que se afirmaram capazes de lutar contra o colonialismo vigente.
O livro de Soutomaior deixa de forma evidente que terá havido contactos, ainda que ténues para que se fizesse qualquer coisa em Luanda. Não fala de nomes, mas não deixa de criticar H. Galvão, que nunca deixou de manter a sua auréola de ideólogo colonialista. Galvão foi governador da Huila, comissário das exposições coloniais, deputado por Angola, escritor que deu tributos brilhantes sobre a flora e fauna africana. Denunciou na Assembleia Nacional fascista o tratamento infligido aos angolanos no decurso do “contrato”, e aí passou a ser um inimigo do regime que o prendeu no Aljube durante oito anos, findos os quais conseguiu fugir e exilar-se na embaixada argentina em Lisboa, iniciando uma luta sem quartel contra Salazar, tornando-se o primeiro homem a desviar um avião no mundo por razões políticas.
Cinquenta anos depois do 4 de Fevereiro de 1961 devemo-nos dedicar mais à história e fazer menos histórias mesmo que sejam quase ao bom nível do Graham Greene, o que é muito difícil.
Fernando Pereira
26/1/2011

21 de janeiro de 2011

"LUBITO"/Ágora/ Novo Jornal / Luanda 21-1-2011




A maioria de uma minoria que me vai lendo neste espaço põe muitas reservas a vários assuntos aqui colocados não sendo mais acutilantes na crítica, porque provavelmente dá-lhes imenso trabalho contestar. Começa a ser normal!


Aqui há tempos ouvi uma história verosímil sobre a avenida Deolinda Rodrigues, em que o interveniente era um diplomata português de visita a Luanda.”Ela nasceu cá?”, ao ver a placa não deixou de manifestar a sua perplexidade por ver o “nome da fadista dado a uma rua” pois “ela era boa fadista mas nada comparável com a Amália Rodrigues”. O que posso dizer é que há testemunhas desta conversa, que foi sem ponta de ironia!

Acabei de ler “Um cesto de cerejas”, um livro magnífico do arquitecto Francisco Castro Rodrigues, editado pela Fundação Mário Dionísio e infelizmente pouco acessível no circuito comercial normal.

Julgo que é um trabalho obrigatório para ser lido por qualquer arquitecto angolano ou estrangeiro a trabalhar em Angola ou qualquer pessoa que se interesse pelo desenvolvimento dos últimos sessenta anos do “Lubito”, cidade com pouco menos de cento e vinte de existência.

Uma obra apaixonante numa linguagem directa, com fotos interessantíssimas, mapas e assertiva quanto às opções que tiveram que ser tomadas, mesmo numa luta desigual contra os interesses instalados do Caminho de Ferro de Benguela e outros menores mas não menos incomodativos e impeditivos.

Francisco Castro Rodrigues fala sem tibiezas, sem procurar poupar inimigos de estimação na defesa intransigente da edificação de uma cidade para angolanos. A sua luta contra o fascismo em Portugal obrigou-o a procurar o “Lubito” no dealbar dos anos 50, onde iniciou uma nova luta contra o colonialismo, lutando simultaneamente contra alguns projectos peregrinos de independência à Ian Smith. Toda esta luta valeu-lhe a cadeia, a não promoção na carreira, para além da proibição de deixar o território, mesmo para receber um prémio de arquitectura no Brasil nos anos 60, pelo mérito indiscutível da sua obra.

No meio de um episódio rocambolesco da saída do “Lubito”, de forma a evitar a perseguição pelas hordas da UNITA, regressa passado um ano e mantêm-se de forma empenhada na sua cidade de sempre que só larga em 1988, impostas pela saúde debilitada da sua companheira de sempre, Maria de Lurdes, falecida uns anos mais tarde já em Azenhas do Mar, onde o Castro Rodrigues se instala e continua a trabalhar no património que deu corpo ao “Museu do Neo-Realismo” em Vila Franca de Xira.

Não podemos andar no “Lubito” sem nos depararmos com a marca de Francisco Castro Rodrigues, e por isso acho da mais elementar justiça que a toponímia da cidade destaque o seu nome. As Portas do Mar, o edifício Universal, a Colina da Saudade, a Casa do Sol, o Liceu Saydi Mingas, o Cine Flamingo, as actuais instalações da Universidade Lusíada o silo-auto da Casa Americana, a reconversão do Tamariz, o Mercado Municipal, a urbanização do Alto Liro, da Bela Vista, o obelisco da entrada, o edifício da aerogare, diversas esculturas, enfim uma cidade com a marca de um verdadeiro arquitecto de muito boas vontades, ideologicamente bem formado, com práticas politicas circunstancialmente discutíveis, mas acima de tudo um homem que serviu o “Lubito” com genialidade, sem pedir em troca o que quer que fosse.

No Sumbe avultam obras suas como por exemplo a catedral, inovadora na concepção e materiais utilizados, os Paços do Concelho e muitas obras particulares principalmente para a família Seixas, os grandes homens do café da região do Amboim no tempo colonial.

Este livro é quase a história do “Lubito”, um guia indispensável para os nados e estabelecidos na terra, para não deixar que certos erros em tempos combatidos sejam novamente postos em execução por falta de “sangue na guelra” dos novos habitantes, que devem fazer jus às lutas dos antecessores.

Conheço o Lobito quase desde que me conheço e quando li este livro foi um desfiar de imagens, histórias e ideias dos tempos em que na varanda dos sapalões ouvia as conversas dos mais velhos sobre o que fazer do “Lubito”.

Um abraço enorme de agradecimento ao Francisco Castro Rodrigues e a Eduarda Dionísio, minha professora no Liceu Camões em Lisboa no fim dos anos 60, que sei que o “intimou” a responder-lhe às perguntas neste magnífico “Cesto de Cerejas”.

Leiam se quiserem saber porque se devia dizer “Lubito” e não Lobito!

Desculpem o OBRIGATÓRIO LER!



Fernando Pereira

17/1/2011

14 de janeiro de 2011

ARQUITEXTURA NA CELA / Novo Jornal/ Ágora/ Luanda / 15-1-2011








Uma das maiores bizarrices da “arquitextura” portuguesa em África é o colonato da Cela, no sudeste da província do Kwanza-Sul.
O termo “arquitextura” é uma originalidade do arquitecto Francisco Castro Rodrigues, um híbrido entre a arquitectura e o conjunto de “texturas”que fazem a vida colectiva de uma comunidade: social, política e económica.
O contexto da criação dos colonatos em que o de maior visibilidade é o da Cela, insere-se na continuidade do sonho de Norton de Matos, admirador confesso de Cecil Rhodes, de “importar” famílias portuguesas que se dispusessem a desenvolver economicamente o País, acabando com as relações comerciais e familiares ancestrais entre tribos de angolanos. Uma situação do tipo “arreda para lá, que esta terra é boa e vocês não sabem o que fazer dela”!
A melhor superfície cultivável, o antecipado apoio económico, a aquisição obrigatória do produto por parte dos serviços estatais no caso de não haver comprador privado, a instalação de um perfeito equipamento social de apoio ao colonato, entre outras mordomias eram direitos dos colonos que os angolanos estavam arredados, depois de lhe terem sido subtraídas as suas lavras, única riqueza que perpetuava a coesão da família tradicional angolana.
O maior mentor dos colonatos foi Vicente Ferreira, por sinal quem elevou a então Nova Lisboa a cidade, que manteve com Armindo Monteiro e Marcelo Caetano algumas divergências, fundamentalmente no que concerne ao recrutamento da mão-de-obra. Vicente Ferreira, assim como Norton de Matos, queria que os colonos dirigissem e os angolanos trabalhassem; Marcelo e Armindo defendiam que os colonos deviam trabalhar, sem recurso aos angolanos. Tecnicamente toda a supervisão, construção, legislação e adaptação foi executada pelo Engº Trigo de Morais e por Pequito Rebelo, que sobre o colonato da Cela dizia em 1961:”Daqui a anos com 100 aldeias, será um distrito Inteiramente branco na África negra, um Portugal em miniatura dentro da sua maior província, de onde irradiará energia colonizadora”. Foi criado em 1952, com o nome de Junta de Povoamento Agrário da Cela.
Não vou falar do PAN (Projecto Aldeia Nova), porque não conheço muito bem, e o que vou sabendo hoje é o que aprendi a ouvir há quarenta anos sobre o mesmo modelo de desenvolvimento agrário na Cela/Wako-Kungo: Um sorvedouro de dinheiro e um apeadeiro para novas oportunidades fora dali.
Um destes dias tive oportunidade de ver um documentário produzido pela RTP nos anos 60, com o inefável Amândio Cesar e o desaparecido Horácio Caio num trabalho sobre o colonato da Cela em que entrevistavam os colonos que por lá Portugal semeou. Era o que se chama o colonialismo serôdio, do pensar curto que cada entrevista deixava transparecer, com perguntas formatadas a respostas já ensaiadas à exaustão. Era o fim de festa anunciado, que em nada diferia da Exposição do Mundo Português na Praça do Império em 1940 na Lisboa capital do Império. Em certos momentos fez-me lembrar momentos de “A testemunha” com Harrison Ford, rodado em torno de uma comunidade Amish na Pennsilvania.
A arquitectura da Cela é qualquer coisa de parecido com o Portugal dos Pequenitos em Coimbra com risco de Cassiano Branco, um arquitecto democrata que desenhou no Lobito a magnífica estação dos CFB, hoje parcialmente ocupada por uma livraria.
Cela em que a sede era Santa Comba, em homenagem ao “Botas”, alcunha de Salazar, e tinha no seu lugar cimeiro uma igreja, copiada em todos os pormenores da que existe em Santa Comba Dão, terra natal do ditador. Havia num perímetro circundante de umas dezenas de Kms cerca de 15 aldeias, o que daria um povoamento total de 350 famílias (28 por aldeia) o que daria cerca de 3000 colonos.
O arquitecto Fernando Batalha desenhou a maior parte das habitações e edifícios públicos da Cela, e fê-lo numa composição simétrica e arcaizante, no âmbito do GAU, com modelo empobrecido da casa portuguesa de Raul Lino. Era a África dos pequenos, com consequências nefastas para todos desde colonos a autóctones e contas públicas, para além do ar sem graça da arquitectura que nada tinha a ver com a realidade onde os edifícios foram implantados.
Sobre este assunto recomendo o livro de Cláudia Castelo, “Passagens para África” editado pela Afrontamento (7-2007), na colecção Biblioteca das Ciencias Sociais. Um excelente trabalho, que convenientemente estudado e com as experiencias já existentes pode conseguir inverter alguns projectos que a leigos parecem desenquadrados e a técnicos com saber reconhecido parecem pura estultícia.
Fernando Pereira
10/1/2011

Palha vã vais ter / Interior / 14-1-2011




Dessei se a maioria de uma minoria que me vai lendo conhece a anedota do comboio parado?
Numa estação de caminho de ferro, onde tinham ficado acidentalmente uns carris que escaparam à socapa da sucata, estavam os três últimos primeiros-ministros de Portugal e Ilhas num compartimento de uma carruagem de comboio completamente imobilizado.
O Duarte, desculpem Durão Barroso, farto de ver passar as horas e o comboio parado, resolve levantar-se e sair. Volta com um ar ufano e diz que prometeu ao maquinista que o iria acompanhar para a Comissão Europeia, onde “sabia que iria chegar, não sabia quando”. O comboio manteve-se parado. Santana Lopes, com aquele ar gingão, um misto de “Maximo Dutti”e “Desigual” levanta-se num ápice e regressa com um sorriso jactancioso afirmando peremptoriamente que o comboio ia andar pois garantiu ao maquinista uma presença na capa da Caras, para além de aumento de honorários. O comboio permaneceu parado. Manifestando algum enfado José Sócrates levanta-se, fecha as cortinas deixando o compartimento numa escuridão total e diz com um ar cândido: “Meus senhores, o comboio está a andar”.
Esta adaptação livre de uma anedota dos tempos da guerra fria tem muito a ver com a realidade do que tem sido Portugal e Ilhas nestes últimos anos. Mia Couto, provavelmente um dos mais virtuosos escritores da Lusofonia, a par de Pepetela, escreveu na sua crónica regular publicada num semanário moçambicano isto: “O nosso país não produz riqueza, produz ricos”. Dirão logo uns quantos que lá vem este tipo a querer comparar Portugal com países de pretos, mas a realidade é que esta frase do Mia sobre a realidade moçambicana assenta que nem uma luva na realidade serôdia da baixa política e do chico-espertismo, em que se foi transformando a economia de mercado onde vamos andando, cantando e quase rindo.
Augura-se um ano de 2011 muito mau para o cidadão comum, mas sei que sabem que há quem saiba que já há gente a viver mal há muito tempo com reformas ao nível da indigência e outras situações do tipo, que para alguns são instrumentos de retórica em determinadas e oportunas circunstancias e para outros são a realidade de um quotidiano triste.
Por causa de tudo que vai acontecendo, e aqui lembro um outro Fernando de apelido Pessoa que dizia “Sim, está tudo certo. Está tudo perfeitamente certo. O pior é que está tudo errado”e hoje ao olhar para um mariscário, lembrei-me da parábola das lagostas. Quando estavam naquela água diziam mal da vida porque tinham saído do mar; Quando foram para a panela detestaram a água e queriam voltar para o mariscário; Quando a temperatura passou para os 40º já pediam os 20º, quando passou para os 50º pediam os 40º e por aí fora até soçobrarem definitivamente nalgum dente com melhor poder de compra e imune à crise.
Parecenças q.b. com o quotidiano da malta, que vamos sentindo que o dia de hoje é sempre melhor que o de amanhã.
Um Bom Ano de 2011, apesar de tudo!
Fernando Pereira

7 de janeiro de 2011

As palavras são como ginguba!/ Ágora/ Novo Jornal / Luanda 7-1-2011


Fernando Pereira 2/1/2011


No dealbar dos anos cinquenta, com a alteração do léxico oficial de colónia para ultramar, iniciou-se por todo o território de Angola, um ritmo diferente de construção de equipamentos públicos que salvaguardariam as necessidades de novas grupos de colonos, que pudessem ajudar a perpetuar a presença de Portugal em África.


A construção acelerada de algumas escolas primárias, fez com que o então ministério do Ultramar recorresse ao modelo padronizado das escolas do “Centenário”. Esse modelo, foi uma adaptação da habitação portuguesa, essa criação peregrina do arquitecto Raul Lino (1879-1974), passando para o que vulgarmente se designa de desenho português-suave. Portugal inteiro tem polvilhadas escolas com estas características, pois começaram a ser construídas para comemorar um conjunto de três centenários glorificados pelo corporativismo salazarista (1140- data da fundação de Portugal, 1640-data da recuperação da independência de Portugal e 1940 – data da Exposição do Mundo Português).

Em Angola importaram-se estes modelos, e em Luanda ainda existem algumas nomeadamente a do Município e a da Av. do Hospital (1º Congresso), com essas características, que realmente se adequavam ao rigor dos invernos europeus, mas que nada tem a ver com a canícula tropical.

Já que se fala nos “centenários”, não deixa de ser bizarro o “enorme esforço de reconstrução de todos os castelos e fortalezas de Minho a Timor” feito por Salazar para enfatizar as comemorações dos 800 anos da fundação de Portugal.

Mandou esculpir milhares de pedras de granito em que dizia: “Este monumento foi restaurado em 1940” e mandou-o colocar em todas as fortificações. Em Massangano, Cambambe, Luanda e Namibe, lá está a pedra que “unia o Império”.Na maioria dos monumentos não se fez rigorosamente mais nada, e assim pôde dizer que foi feita uma intervenção em todo o lado.

Já que se fala em esculpir, soube que faleceu em Curitiba onde se instalou em 1979 Octávio Nascimento Canhão Bernardes (1919-2010), que deixou obra escultórica de grande qualidade particularmente no Lobito onde vivia, havendo registo de trabalhos em Benguela, Sumbe, Huambo e Bié. Economistas de formação, a qualidade das suas peças escultóricas não deixavam transparecer a sua aprendizagem autodidacta. “Caminhante” e o “Poeta”na Restinga, a “Sereia” na baía e “Cavalo Esvoaçante”, em frente ao aeroporto, perpetuam um trabalho muito rico de um homem que nunca recebeu nada em troca.

Vou ouvindo, vendo e lendo que já anda aí na forja mais uns estudos para novos planos gerais de reabilitação urbana da nossa cidade capital. Talvez seja mais um pagar um balúrdio a umas empresas, e no fim os resultados da grande maioria dos estudos em Angola em diversas áreas volatilizam-se e encomendam-se outros!

No final dos anos sessenta, foi feito um Plano Geral de Urbanização da cidade de Luanda por uma empresa francesa, que ao tempo levou ao governo provincial cento e cinquenta mil dólares, para além de outros gastos como alojamento, transportes, seguros e outras alcavalas. Era muito dinheiro para a época, mas na realidade era um plano muito sério, e que previa que Luanda tivesse 2.000.000 de habitantes no ano 2000, o que de facto veio a acontecer. Esse plano foi rejeitado pela pressão imobiliária, e logo apareceram uns arquitectos portugueses a alterar o plano em benefício naturalmente da pressão dos proprietários dos terrenos, muitos deles subtraídos de forma ilícita a famílias angolanas prestigiadas.

Não sou arquitecto mas para Taveiras e quejandos rejeitarem esse projecto parto do princípio que era capaz de não ser um mau trabalho, e poderia servir de base para alguma coisa que ainda fosse possível salvaguardar numa planificação assertiva de edificação de uma Luanda minimamente aceitável para se viver.

Bom Ano de 2011 para todos vós!

Fernando Pereira 2/1/2011
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